sexta-feira, 18 de maio de 2012

A menina dourada - Parte 1


Vi de perto e reparei de longe aquela garota de cabelo ruivo, quase uma adulta, tentando montar um enorme quebra-cabeça.
Afastando todos os que se aproximaram oferencendo-lhe ajuda, ela segurou firmemente uma das peças contra o peito e, ao fechar os olhos, abaixou a cabeça como quem quer passar despercebido.
Minutos depois, ainda com o rosto abatido, ela recolheu todas as peças e as jogou dentro de uma mochila jeans com bolsos de couro preto, que parecia nunca ter sido lavada. Desconfiada, olhou para os lados e para trás, com a mochila ainda nos braços.
Não consegui disfarçar que a observava e, por impulso, levantei as sobrancelhas e dei meio sorriso, como se a conhecesse.
Ela comprimiu os lábios secos e pálidos e chamou-me, fazendo sinais com as mãos.
Lá fui.
A garota ruiva abriu mais uma vez a mochila e, sem dizer uma única palavra, me mostrou as peças do quebra-cabeça. Jogou-as
no chão, sentou-se junto a elas e me olhou como se fizesse um convite.
Lá sentei.
Começamos, então, a montá-lo.
O silêncio me matava, mas tinha medo de não saber puxar o assunto certo.
Assim foi durante os primeiros minutos, até que eu curiosa, perguntei o que estavamos montando.
- Um quebra-cabeça, oras! - respondeu-me como se isso já não fosse óbvio.
- Disso eu sei. Me refiro ao desenho - insisti.
Com cara de desdém ela pegou outra peça e fitou a parte ja montada procurando seu lugar.
O silêncio, outra vez, era o dono do espaço.
Larguei as peças, que punha sobre o colo, no chão e fiquei olhando a ruiva suar frio de nervoso, por não conseguir encontrar
o lugar certo de cada peça. Hora colocava a mão sob o queixo, outrora respirava fundo, olhava pra mim e coçava a cabeça.
Quebrei novamente o silêncio e disse em tom alto:
- Se você me disser qual desenho estamos tentando montar, pode ficar mais fácil.
Ela jogou as peças na mochila outra vez, levantou-se com pressa e saiu correndo sem se despedir.
Eu não entendia tamanha estranhesa e a deixei ir com uma peça a menos, que havia ficado no chão.
Tudo indicava que era uma das peças centrais - pois tinha encaixe nos quatro lados - e que completaria uma palavra ou frase.
As letras "ens" estampavam a tal peça.
Coloquei-a no bolso e quando olhei para o fim da rua, a ruiva louca já havia desaparecido.

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